Leonardo de Oliveira Ribeiro
Resumo:
O presente trabalho tem como objetivo central explicitar quais são e em quais
casos específicos podem ser empregadas as penas restritivas de direitos, também
chamadas “penas alternativas”, sendo neste entranhados conceitos doutrinários
acerca do referido assunto.
Introdução
A toda contextualização
contemporânea se faz necessário o uso do passado como ponto de partida para uma
maior e mais abrangente explicitação e entendimento de determinado assunto.
Sendo assim, parte-se do pressuposto de que penas eram entendidas, em tempos
remotos, como: uma força maior, sendo às vezes o próprio “Estado”, que
exerceria de seu poder de comando sobre o indivíduo que tivesse perturbado o
bem comum, ou a paz social, sendo seus atos incontestáveis e legítimos sem
restrições de qualquer natureza, e também mutáveis a qualquer tempo pelo
governante, ou como na Mesopotâmia (Código de Hamurabi) em que o cidadão
poderia exercer o direito de punir se seu próprio direito tivesse sido
agredido.
As penas eram aplicadas
sem a observação de qualquer pré-requisito, sendo estas muitas vezes desumanas,
injustas e cruéis. Beccaria ressalta em sua magnífica obra Dos Delitos e das
Penas:
“Quanto mais terríveis forem os
castigos, tanto mais cheio de audácia será o culpado em evitá-los. Praticará novos
crimes, para subtrair-se á pena que mereceu pelo primeiro.”
A implementação de uma
ordem maior (Lei) que pudesse regrar os atos Estatais e disciplinar os comportamentos
sociais foi surgindo ao longo do tempo, e permanece até aos dias de hoje, sendo
entendidos como a melhor maneira de limitar tal poder no que diz respeito à
arbitrariedade encontrada como algo maléfico nos tempos antigos, e também como
maneira organizada e pré-estabelecida para disciplinar todas as relações
sociais, sendo estas, comerciais, civis, trabalhistas, penais, entre outras.
A natureza punitiva
continua sendo a mesma, um Estado com poder legítimo para punir, mas agora com
restrições às suas ações, bem como aos meios de punição, sendo vedados todos os
atos que não estejam em conformidade com uma “Lei” já anteriormente
pré-estabelecida (segundo o Princípio da Legalidade, explícito no artigo 1º do
Código Penal) para a disciplina e cominação penal de um ato tido por criminoso;
“Art. 1º: Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação
legal.”. Na esplêndida obra de Montesquieu, O Espírito das Leis, ele ressalta:
“É, entre nós, um
grande erro aplicar o mesmo castigo ao que assalta estradas e ao que rouba e
assassina. É evidente, para a segurança pública, que se deveria estabelecer
alguma diferença na pena”.
Vê-se nítido os olhares
afincos da sociedade direcionados ainda a um pensamento mesopotâmico, de “olho
por olho e dente por dente”, bem como se vê também diretrizes em massa acerca
de pensamentos desumanos, como penas absurdas sem que haja contestação do
apenado, e até mesmo pena de morte. Tais pensamentos, como já dito, atingem uma
massa populacional exacerbadamente grande, que ainda tem intrínsecos em sua
natureza a pena como algo que deva “excluir”, e não com a finalidade de
ressocializar.
A pena, nos dias de
hoje, tem como meio o caráter punitivo, mas sua finalidade é a ressocialização
e a prevenção, ou seja, a reimplantação do indivíduo na sociedade que outrora “desrespeitou”,
para garantir que o mesmo não volte a cometer outros ou os mesmos delitos.
Em análise sucinta à
possibilidade da abrangência dessa finalidade aos indivíduos delinqüentes,
vê-se com clareza o desfalque etimológico da palavra ressocializar em face à perturbadora
realidade. Tendo em vista que não se vê hoje senão uma grande maioria de indivíduos
saindo de prisões e cometendo delitos ainda piores do que os quais entraram,
fazendo-os até com mais técnica, dando certamente a entender que o sistema
penitenciário é senão uma “fábrica de profissionais do crime”, dando ênfase à
frase de Evandro Lins e Silva quando diz que a prisão “perverte, corrompe,
deforma, avilta, embrutece. É uma fábrica de reincidência, é uma universidade
às avessas, onde se diploma o profissional do crime.”
Em detrimento a tal
realidade e ao fato de seu exacerbado e preocupante crescimento surge o advento
de medidas alternativas à reclusão e detenção (Penas Privativas de Liberdade),
chamadas Penas Restritivas de Direitos, ou Penas Alternativas, ou ainda Medidas
Alternativas, que serviriam para casos de crimes de menor potencial ofensivo.
I
– Das espécies de pena
I.I
– Privativas de Liberdade
As espécies de penas
estão dispostas no artigo 32 do Código Penal, sendo estas: I – privativas de
liberdade; II – restritivas de direito; III – de multa.
As penas privativas de
liberdade se subdividem em: Reclusão e Detenção.
“A pena de reclusão
deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção, em
regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime
fechado.” (Art. 33, caput, CP)
O regime fechado
dar-se-á “em estabelecimento de segurança máxima ou média.” (Art. 33, § 1º,
alínea “a”, CP) e será estabelecido quando o condenado for acometido “a pena
superior a 8 (oito) anos.” (Art. 33, § 2º, alínea “a”, CP) ; enquanto o regime
semiaberto dar-se-á em “colônia agrícola, industrial ou estabelecimento
similar.” (Art. 33, § 1º, alínea “b”, CP) e estabelecer-se-á ao “condenado não
reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito),
poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto.” (Art. 33, § 2º,
alínea “b”, CP); e o regime aberto em “casa de albergado ou estabelecimento
adequado.” (Art. 33, § 1º, alínea “c”, CP), sendo estabelecido ao “condenado
não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá,
desde o início, cumpri-la em regime aberto.” (Art. 33, § 2º, alínea “c”, CP). As mulheres cumpriram pena
em estabelecimento próprio (regime especial) conforme disposto no artigo 37 do
Código Penal.
As penas privativas de
liberdade têm caráter progressivo, ou seja, o bom comportamento do preso e o
cumprimento parcial estabelecido em lei garantem sua progressão de regime,
conforme o disposto no art. 112 da Lei 7.210/1984 (Lei de Execução Penal).
I.II
– Restritivas de Direitos
Essas penas foram
criadas com a finalidade de alcançar em sua totalidade os crimes de menor
potencial ofensivo, e assim discipliná-los com outra forma de sanção penal que
não seja a pena privativa de liberdade, ou seja, as Penas Restritivas de
Direito, ou Penas Alternativas, partem em primeiro plano em busca da substituição
das penas privativas de liberdade, para que o indivíduo tenha chances de
ressocialização fora dos portões carcerários, mas indubitavelmente sem deixar
de ser devidamente punido pelo ato delituoso.
Elas são aplicadas em
períodos de curta duração, zero a quatro anos, em delitos como: injúria,
difamação, calúnia, furto, desacato à autoridade, lesão corporal leve, entre
outros disciplinados por nosso ordenamento jurídico que sejam considerados de
menor potencial ofensivo.
Não eram muito
aplicadas no Brasil pela dificuldade encontrada pelo judiciário na fiscalização
acerca dos cumprimentos das prestações, já que a infraestrutura estatal não
colaborava para tal feito, e sendo problema também para a população, que não
olhava com bons olhos para essas medidas, tendo intrínseca a idéia de que esta
não era punição cabível.
Elencadas no artigo 43 do Código Penal são
elas: a) prestação pecuniária; b) perda de bens e valores; c) prestação de
serviços à comunidade ou a entidades públicas; d) interdição temporária de
direitos; e) limitação de fim de semana.
I.II.I
– Prestação Pecuniária
“A prestação pecuniária
consiste no pagamento em dinheiro à vítima”, em caso este não o possa receber,
a seus dependentes, em caso esses também não o possam, então dar-se-á “à
entidades públicas ou privadas com destinação social”. Esta prestação (o quantum) será sempre superior a um
salário mínimo e inferior a trezentos e sessenta salários mínimos.
O leque da prestação
pecuniária é aberto no § 2º do artigo 45 do Código Penal, sendo aplicável,
quando na “aceitação do beneficiário”, a prestação de outra natureza, como por
exemplo, as antigas, mas famosas, “cestas básicas”, que há não muito tempo
atrás foram regularmente usadas como prestação pecuniária, sem às vezes haver
se quer o consentimento do beneficiário, o que era estranho aos olhos da lei,
mas foram muito utilizadas, na época, pelos magistrados.
Importante se faz
ressaltar que prestação pecuniária e multa têm diferenças, sendo que a primeira
o montante beneficia uma pessoa, seja ela a vítima, seus dependentes, ou
entidades públicas ou particulares com destinação social, enquanto a segunda,
reverte-se a favor do Estado.
I.II.II
– Perda de Bens e Valores
Esta espécie de pena
alternativa está disposta pelo artigo 45, em seu § 3º, que dispõe: “A perda de
bens e valores pertencentes aos condenados dar-se-á, ressalvada a legislação
especial, em favor do Fundo Penitenciário Nacional, e seu valor terá como teto
– o que for maior – o montante do prejuízo causado ou do provento obtido pelo
agente ou por terceiro, em conseqüência da prática do crime”, ou seja, todo
proveito que o delinqüente obteve em razão da conduta criminosa ou ainda todo
prejuízo causado por este será revertido ao Fundo Penitenciário Nacional,
ressalvada legislação especial.
Vale ressaltar que esta
modalidade de pena, nada tem a ver com a perda em favor da união, tratada pelo
artigo 91, inciso II, Código Penal, e assim diferencia Victor Eduardo Rios
Gonçalves:
“A perda em favor da União é um
efeito secundário da condenação (aplicado conjuntamente à pena privativa de
liberdade ou de outra natureza), dos instrumentos do crime, que consistam em
coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito,
ou do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito
auferido pelo agente com a prática do ato criminoso”
I.II.III
– Prestação de Serviço à Comunidade
Disciplinada pelo
artigo 46, a prestação de serviço à comunidade tem como objetivo fazer com que
o apenado retribua à sociedade o dano que outrora provocou, com a finalidade de
reinserção social sem os estigmas que uma pena privativa de liberdade, ainda
que de curta duração, poderia causar.
Importante é deixar
claro que esta modalidade de pena, tem caráter retributivo, e não o é de modo
algum considerado trabalho forçado, como assim vedado por nossa Carta Magna,
sendo observadas as aptidões do condenado, de maneira que o serviço a ser
prestado não prejudique seu trabalho, devendo ser cumpridas à razão de uma hora
de tarefa por dia de condenação (Art. 46, § 3º, CP).
Esta pena é imposta por
tempo limitado, e é aplicável aos condenados à pena privativa de liberdade
superior a seis meses (Art. 46, caput, CP), é prestada gratuitamente (Art. 46,
§ 1º, CP), e dar-se-á em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos
e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais
(Art. 46, § 2º, CP).
A lei permite que esta
prestação seja cumprida em tempo inferior ao da pena privativa de liberdade,
desde que a pena substituída seja superior a um ano, e não seja efetuada em
período inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada, conforme os
ditames do artigo 46, em seu § 4º do Código Penal.
As penas de prestação
de serviço à comunidade poderão ser convertidas em privativas de liberdade
quando o apenado: I) Não for encontrado por estar em lugar incerto e não sabido
ou desatender à intimação por edital; II) Não comparecer, injustificadamente, à
entidade ou programa em que deve prestar serviço; III) Recusar-se,
injustificadamente, a prestar o serviço que lhe for imposto; IV) praticar falta
grave; V) sofrer condenação por outro crime à pena privativa de liberdade cuja
execução não tenha sido suspensa; Reza o artigo 181, § 1º, da LEP (Lei de Execuções Penais).
I.II.IV
– Interdição Temporária de Direitos
É classificada com uma
das mais importantes modalidades de penas alternativas, pois reflete
explicitamente na limitação dos direitos individuais do apenado. Sendo assim, o
artigo 47 do Código Penal traz em seu texto quais sejam estas limitações:
“I – proibição do
exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo;
II – proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público;”
II – proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público;”
O disposto nestes dois
incisos aplica-se aos crimes praticados durante o exercício de profissão,
atividade, ofício, cargo ou função, sempre que houver violação dos deveres que
lhes são inerentes, conforme o disposto no artigo 56 do Código Penal.
“III – suspensão de
autorização ou de habilitação para dirigir veículo;”
Conforme neste
explicitado, aplica-se também aos crimes culposos de trânsito, conforme os
ditames do artigo 57 do Código Penal.
“IV – proibição de
freqüentar determinados lugares;”
Tal proibição é
aplicada quanto aos lugares que tenham a ver com a conduta delituosa praticada e
que assim possam ter influência criminal sobre o condenado, como por exemplo, casas
noturnas, bares, estádios de futebol, etc.
O parágrafo 3º do
artigo 181 da Lei de Execuções Penais, também poderá converter-se em privativa
de liberdade na hipótese de o apenado exercer, injustificadamente, o direito
interditado ou se ocorrer as hipóteses das letras a e e do parágrafo 1º
deste mesmo artigo, sendo estas: “a) não for encontrado por estar em lugar
incerto e não sabido, ou desatender à intimação por edital; e) sofrer
condenação por outro crime à pena privativa de liberdade, cuja execução não
tenha sido suspensa.”
I.II.V
– Limitação de Fim de Semana
Dispõe claramente o artigo
48 do Código Penal sobre esta modalidade de pena:
“Art. 48 – A limitação
de fim de semana consiste na obrigação de permanecer, aos sábados e domingos,
por 5 (cinco) horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento
adequado.” E o parágrafo único do mesmo artigo ainda disciplina que “poderão
ser ministradas ao condenado cursos e palestras ou atribuídas atividades
educativas.”
Esta modalidade de pena
ainda parece um fictício jurídico, pois para o cumprimento da mesma é
necessário que haja casas de albergado ou estabelecimentos adequados, que são
escassas, infraestrutura e profissionais qualificados com a finalidade de uma
real reeducação social.
Ademais, o parágrafo 2º
do artigo 181 da Lei de Execuções Penais ainda prevê a conversão desta
modalidade de pena restritiva de direito à privativa de liberdade quando o
condenado não comparecer ao estabelecimento designado para o cumprimento da
pena, ou ainda recusar-se a exercer a atividade determinada pelo juiz ou se
ocorrer qualquer das hipóteses das letras a,
d e e do parágrafo 1º do referido artigo.
I.III
– De Multa
O artigo 49 do Código
Penal dispõe de maneira clara acerca desta modalidade de pena, sendo “a pena de
multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na
sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo,
de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.”, sendo o valor do dia-multa fixado
pelo juiz não inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao
tempo do fato gerador, nem superior a cinco vezes esse salário.
A pena de multa está
disposta integralmente na Seção III do Código Penal dos artigos 49 a 52.
I.IV
– Referências Bibliográficas
MONTESQUIEU. "Do Espírito das Leis", Coleção Os
Pensadores, Nova Cultural, 2000
BECCARIA, Cesare. "Dos Delitos e das Penas", Martin Claret,
2000
GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Código
Penal - Parte Geral, 4ª ed. Saraiva, 2000
JESUS, Damásio Evangelista
de. Direito Penal – Parte Geral, Vol. 1, 31ª ed., Saraiva, 2010