sábado, 11 de maio de 2013

DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL

Italo Piantamar Cavenaghi

ÍNDICE
Introdução. 1. Principio da Legalidade. 2. A Lei Penal no Tempo. 2.1. Competência para a aplicação de lei mais benéfica. 2.2. Lei intermediaria. 2.3. Leis temporárias e excepcionais. 2.4. Norma penal em branco e direito intertemporal. 2.5. Tempo do crime. 3. Lei Penal no Espaço. 3.1. Territorialidade. 3.2. Lugar do crime. 4. Extraterritorialidade. 5. Pena Cumprida no Estrangeiro. 6. Extradição. 7. Legislação Especial. Referências Bibliográficas.

INTRODUÇÃO
Sabe-se que a lei é a única fonte imediata de conhecimento do Direito Penal, assim, o presente trabalho aborda os princípios que regem a matéria, de maneira ampla e explicativa, colocando possíveis conflitos na aplicação da lei penal e, assim, suas respectivas soluções.
O objetivo do artigo abaixo é levar para a sociedade o conhecimento sobre o tema, base do Direito Penal, de uma importância incomparável. Servindo assim, para objeto de pesquisa de acadêmicos do curso de Direito e afins.

1 – PRINCIPIO DA LEGALIDADE

Inscrito no art. 1º do Código Penal: “Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”. Consagrado também na Constituição Federal, tendo assim um significado político, no sentido de ser uma garantia constitucional dos direitos do homem.
A doutrina subdivide o Princípio da Legalidade em:
a) Princípio da Legalidade (ou de Reserva Legal): não há crime sem lei anterior que o defina; não há pena sem cominação legal. Apenas a lei em sentido formal pode descrever condutas criminosas, assim, é vedado ao legislador utilizar-se de decretos, medidas provisórias ou outras formas legislativas para incriminar condutas.
b) Princípio da Anterioridade: Para que haja crime é preciso que o fato seja cometido após a entrada em vigor da lei incriminadora que o define.

2 – A LEI PENAL NO TEMPO

A lei rege, em geral, os fatos praticados durante a sua vigência, não pode, em tese, alcançar fatos ocorridos antes e depois deste período.
Porem é possível que haja conflitos de leis penais no tempo, como por exemplo, um crime iniciado sob a vigência de uma lei tenha seu momento consumativo sob a de outra, e neste ultimo momento, a lei em vigor seja mais benéfica ou mais severa, surge um conflito de leis penais no tempo e a necessidade de princípios para solucioná-lo.
A corrente doutrinaria majoritária defende que, havendo conflito de leis penais com o surgimento de novos preceitos jurídicos após a pratica de fato delituoso, aplica-se a lei mais favorável. Temos algumas hipóteses de conflitos de leis penais no tempo:
a) Novatio Legis Incriminadora: lei nova que torna típico fato anteriormente não incriminado, segundo o principio da anterioridade, a lei nova não pode ser aplicada.
b) Abolitio Criminis: lei nova não incrimina fato que anteriormente era considerado como ilícito penal; nesta hipótese temos o principio da retroatividade da lei mais benigna.
 c) Novatio Legis In Pejus: refere-se à lei nova mais severa que a anterior, nesta hipótese observamos o principio da irretroatividade da lei penal, “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu” (art. 5º XL da CF).
d) Novatio Legis In Mellius: lei nova mais favorável que anterior, pode favorecer o agente; regulada no art. 2º, parágrafo único do Código Penal, com a seguinte redação: “A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado”.

2.1. – Competência para a aplicação da lei mais benéfica
Cabe ao magistrado que presidir o processo enquanto não houver proferido a sentença, se o feito já estiver sentenciado, cabe ao tribunal que decidir tal recurso.

2.2. – Lei intermediaria
No caso de vigência de três leis sucessivas, regulando comportamento praticado pelo agente, deve-se aplicar a mais benigna.

2.3. – Leis temporárias e excepcionais
Temporárias, são aquelas que possuem vigência previamente fixada pelo legislador; Excepcionais, são aquelas que vigem durante casos de calamidade pública, guerras, revoluções, epidemias etc.
Não derrogam o principio de reserva legal, porem são ultra-ativas, ou seja, são aplicadas aos fatos praticados durante a sua vigência.

2.4. – Norma penal em branco e direito intertemporal
Quando revogada ou alterada uma norma complementar, não desaparecerá o crime, pois, o que foi modificado foi o complemento e não a lei.
Pode-se concluir, observando que, há de se fazer uma distinção:
“(...): (a) se a norma penal em branco tem caráter excepcional ou temporário, aplica-se o art. 3º do CP, sendo a norma complementar ultrativa; (b) se, ao contrario, não tem ela caráter temporário ou excepcional, aplica-se o art. 2º, parágrafo único, ocorrendo a abolitio criminis”. (MIRABETE, Julio Fabbrini, Manual de direito penal/Julio Fabbrini Mirabete. – 22. ed. pg.70. – São Paulo: 2005).

2.5. – Tempo do crime
Tem relevância jurídica não somente para fixar a lei que vai reger sob o delito praticado, mas também para fixar a imputabilidade do agente.
Temos várias teorias, porem três se destacam:
a) Teoria da Atividade: atende-se no momento da ação ou omissão.
b) Teoria do Resultado: considera-se o momento do resultado (evento ou efeito)
c) Teoria Mista: pode-se considerar o momento da ação/omissão ou do resultado.
O Código Penal Brasileiro adotou a Teoria da Atividade, “Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado”, art. 4º do CP.

 3 – LEI PENAL NO ESPAÇO

Um fato criminoso praticado pode ter interesse entre dois ou mais países, como no caso em que o autor começa tal fato em um país e o consuma em outro, pode-se também considerar a nacionalidade do agente. Assim, temos um conflito de normas de um Estado, com as normas de outro.
Estamos em face do denominado Direito Penal Internacional, que “estabelece regras de determinação da lei aplicável em caso de a conduta punível lesar o ordenamento jurídico de mais de um Estado”. (JESUS, Damásio E. de, Direito penal, volume 1: parte geral/Damásio E. de Jesus. – 28.ed. pg. 121. rev. – São Paulo: Saraiva, 2005).
A doutrina aponta cinco princípios a respeito da aplicação da lei penal no espaço, são elas:
1) Principio da Territorialidade: prevê a aplicação da lei penal no território que a determinou, sem considerar a nacionalidade do agente.
2) Principio da Nacionalidade: considera-se a nacionalidade do agente, podendo ser aplicada em outro Estado, divide-se em:
a) Principio da Nacionalidade Ativa: aplica-se a lei nacional ao cidadão que cometeu o crime, não considerando a nacionalidade do sujeito passivo.
b) Principio da Nacionalidade Passiva: considera-se a nacionalidade dos dois agentes, só poderá ser aplicada a lei nacional se o agente passivo possuir a mesma nacionalidade que o autor.
3) Principio da Defesa (Principio da Competência Real, de Proteção): neste principio, o que é observado é a nacionalidade do bem jurídico lesado, independentemente de local ou da nacionalidade do sujeito.
Ensina Cezar Roberto Bitencourt:
“Em tempos de “economia global”, os interesses nacionais têm sido violados, desrespeitados e, às vezes, até ultrajados no estrangeiro, com grande frequência. Por isso, esse principio adquire grande importância na seara do Direito Penal no espaço, ante a necessidade de o Estado, cada vez mais, proteger seus interesses alem fronteiras”. (BITENCOURT, Cezar Roberto, Tratado de direito penal: parte geral, volume 1/Cezar Roberto Bitencourt. – 9. ed. pg. 159 – São Paulo: Saraiva, 2004).
4) Principio da Justiça Penal Universal: o criminoso deverá ser julgado, independente de sua nacionalidade, do lugar do crime ou do bem jurídico lesado, onde for encontrado.
5) Principio da Representação: diz respeito aos crimes praticados em aeronaves e embarcações privadas; quando existe o desinteresse de quem deveria julgar, considera-se a lei do Estado em que a aeronave ou embarcação está registrada.

3.1. – Territorialidade
Prevê o art. 5º, caput, do Código Penal Brasileiro: “Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional”.
Nota-se que o Código adotou o Principio da Territorialidade, não de forma absoluta, como dito no próprio caput.
Conceito de território, segundo Cezar Roberto Bitencourt:
“(...). O território nacional – efetivo ou real – compreende: a superfície terrestre (solo e subsolo), as águas territoriais (fluviais, lacustres e marítimas) e o espaço aéreo correspondente. Entende-se, ainda, como sendo território nacional – por extensão ou flutuante - as embarcações e as aeronaves, por força de uma ficção jurídica. (...)”. (BITENCOURT, Cezar Roberto, Tratado de direito penal: parte geral, volume 1/Cezar Roberto Bitencourt. – 9. ed. pg. 160 – São Paulo: Saraiva, 2004).

3.2. – Lugar do crime
Tarefa importante para se adotar o principio da territorialidade, mas nem sempre fácil. É decisiva no tocante à competência penal internacional.
Três são as teorias a respeito desse assunto:
1ª) Teoria da Atividade (ou da Ação): local do crime é o local da conduta, onde o agente desenvolveu a conduta típica.
2ª) Teoria do Resultado (ou do Efeito): é o local onde ocorre o resultado, isto é, onde o crime se consumou.
3ª) Teoria da Ubiqüidade (Mista ou Unitária): lugar do crime tanto pode ser o da ação como o do resultado, é a teoria dominante da doutrina e das legislações penais.
Nos chamados crimes a distancia, a fixação do critério é necessário; no Brasil, adotou-se a ultima das teorias, como se nota no art. 6º do CP: “Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou devia produzir-se o resultado”. Assim, quando um crime tem inicio em território estrangeiro, mas a sua consumação ocorre no Brasil, aplica-se a Lei Penal Brasileira.
O Legislador foi infeliz, deixando uma possível lacuna, quando o resultado for parcial, por exemplo, o agente pratica determinada ação ou omissão em território estrangeiro, porem, parte do resultado venha a acontecer aqui, mesmo que contra a vontade do agente. Entretanto, pode-se considerar parte do resultado como todo o resultado, é isso que ocorre, aplicando-se a lei penal brasileira.

4 – EXTRATERRITORIALIDADE

Prevista no art. 7º do Código Penal Brasileiro, trata de uma serie de casos em que a lei pode ser aplicada a crimes cometidos em território estrangeiro, são duas as hipóteses:
a) Extraterritorialidade Incondicionada: aplica-se a lei penal brasileira sem qualquer condicionante, ao crime praticado no estrangeiro, prevista no inciso I do art.7º.
b) Extraterritorialidade Condicionada: aplica-se a lei penal brasileira quando satisfeitos certos requisitos, dispostos no art. 7º, II e §§ 2º e 3º, do Código Penal, com base nos princípios da universalidade, da personalidade, da bandeira e da defesa, observados no art. 7º do CP.
Quando o crime praticado por estrangeiro contra brasileiro, em território estrangeiro, reunir, além das condições dispostas, mais as seguintes: a) não tiver sido pedida ou tiver sido negada a extradição; b) houver requisição do Ministro da Justiça (art. 7º, § 3º), aplica-se a lei brasileira. Porem deve-se observar algumas condições para a aplicação da lei brasileira nessas hipóteses, dispostas no art. 7º § 2º do CP, são elas:
a) entrada do agente no território nacional;
b) o fato ser punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles que a lei brasileira autoriza a extradição;
d) o agente não ter sido absolvido no estrangeiro ou não ter ai cumprido a pena;
e) não ter sido perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável;

5 – PENA CUMPRIDA NO ESTRANGEIRO

Reza o art. 8º do CP: “A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas”.
Ensina Julio Fabbrini Mirabete:
“(...). Assim, cumprida a pena pelo sujeito ativo do crime no estrangeiro, será ela descontada na execução pela lei brasileira quando forem idênticas (penas privativas de liberdade, por exemplo), respondendo efetivamente o sentenciado pelo saldo a cumprir se a pena imposta no Brasil for mais severa. Se a pena cumprida no estrangeiro for superior à imposta no País, é evidente que está não será executada.
No caso de penas diversas (privativas de liberdade e pecuniárias, por exemplo), aquela cumprida no estrangeiro atenuará a aplicada no Brasil, de acordo com a decisão do juiz no caso concreto, já que não há regras legais a respeito dos critérios de atenuação que devem ser obedecidos”. (MIRABETE, Julio Fabbrini, Manual de direito penal/Julio Fabbrini Mirabete. – 22. ed. pg.81. – São Paulo: 2005).

6 – EXTRADIÇÃO

Significa entregar a outro país o autor de um crime, que se encontra refugiado, para ser julgado e punido.
Segundo o Congresso Internacional de Direito Comparado de Haia, 1932, a extradição é “uma obrigação resultante da solidariedade internacional na luta contra o crime”. (BITENCOURT, Cezar Roberto, Tratado de direito penal: parte geral, volume 1/Cezar Roberto Bitencourt. – 9. ed. pg. 171 – São Paulo: Saraiva, 2004).

7 – LEGISLAÇÃO ESPECIAL

Reza o art. 12 do Código Penal: “As regras gerais deste Código aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso”. Referindo-se à Lei de Tóxicos, à Lei das Contravenções Penais, ao Código Penal Militar, à Lei de Imprensa etc. Assim, as normas contidas no Código na Parte Geral e, as normas não incriminadoras na Parte Especial, são aplicáveis em toda a legislação especial. Havendo o conflito, entre o Código e a lei especial, aplica-se o principio da especialidade, que nos diz: a regra contida na lei especial prevalece sobre a determinada pelo estatuto regressivo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, volume 1/ Cezar Roberto Bitencourt. – 9. ed. – São Paulo: Saraiva, 2004.
JESUS, Damásio E. de, 1935 – Direito penal, volume 1: parte geral/ Damásio E. de Jesus. – 28. ed. rev. – São Paulo: Saraiva, 2005.
MIRABETE, Julio Fabbrini, Manual de direito penal/ Julio Fabbrini Mirabete. 22. ed. – São Paulo: Atlas, 2005.